top of page

Sustentabilidade no mundo dos negócios e economia regenerativa

Estamos vivendo um momento de mudanças cruciais e profundíssimas nas nossas vidas. Aquilo que podia ser difícil assumir e aceitar no passado, em poucos meses está se impondo. Na Aventura de Construir chamamos esta mudança, que nos solicita novos pensamentos, hábitos, estilos de construção e trabalho, de “o OUTRO normal”. Este artigo da AUPA nos ajuda em aprofundar o que significa este “outro normal” quando se refere a sustentabilidade, que não é um conjunto de regras a serem cumpridas como muitos ainda enxergam, mas, sim, um jeito de considerar a vida em tudo o que se faz. Boa leitura!!! E se deixem provocar porque cada um de nós tem uma responsabilidade sem limites neste outro normal!

O termo “sustentabilidade”, muitas vezes, é deixado de lado como um conceito abstrato, carregado de jargões. Porém, os negócios têm um papel crítico na aceleração da mudança transformacional, aliada às demandas sociais, ambientais e econômicas que dizem respeito aos três pilares da sustentabilidade.

Consequentemente,no futuro, as empresas que prosperarão serão aquelas que descobrirem como aproveitar essas mudanças para atender às reais necessidades humanas – colocando a sustentabilidade no centro da estratégia de negócios.

Portanto, os compromissos socioambientais estão ganhando espaço no mundo dos negócios, simultaneamente ao fato do planeta enfrentar inúmeros desafios globais.

Hoje, muitas empresas que estão cientes do problema começam a agir incorporando o conceito de sustentabilidade como um dos pilares do trabalho. À medida que os consumidores se tornam mais instruídos, também procuram negócios que compartilhem seus valores.

Um exemplo dessa preocupação é a Fundação Ellen MacArthur que, com sede no Reino Unido, mas que também atua na América Latina, na América do Norte, na Ásia e na Europa. Esta fundação incentiva um modelo de crescimento econômico que busca a proteção do meio ambiente, seguida da prevenção da poluição e do desenvolvimento sustentável.

Inclusive, no Brasil, o Mapa de Negócios de Impacto Social+Ambiental (2019), realizado pela Pipe.Social – plataforma de conexões para fomentar o impacto social –, mostra os principais desafios e oportunidades para esse tipo de empreendedorismo, aqueles voltados ao negócio social. Este estudo faz um panorama da área como forma de pensar em estratégias para apoiar os diversos setores. Para este mapeamento, foram analisados 1.002 negócios das áreas de Educação, Saúde, Serviços Financeiros, Cidadania, Cidades e Tecnologias Verdes. O crescimento das tecnologias verdes se destaca em negócios que olham para a sustentabilidade, estando em 46% das áreas de impacto.

Todo esse movimento vai ao encontro do alerta publicado em novembro de 2019, na revista BioScience. O “Aviso de Emergência Climática do Cientista Mundial” foi assinado por mais de 11.000 cientistas de todo o mundo. Confira um trecho:

“… declaramos, claramente e inequivocamente, que o planeta terra está enfrentando uma emergência climática. (…) atenuar e adaptar-se às mudanças climáticas, honrando a diversidade de seres humanos, implica grandes transformações nas formas como nossa sociedade global funciona e interage com os ecossistemas naturais.”

O alerta preocupa, mas também serve de apoio e reflexão. Para as empresas alcançarem o sucesso em suas operações e despontarem na competitividade é importante que aprimorem suas práticas de inovação voltadas à sustentabilidade. Mas como isso funciona? Com esforço, projeto e muito trabalho, e, principalmente, agregando valor à economia regenerativa nas empresas.

Economia regenerativa em ambiente corporativo

Por economia regenerativa entende-se o negócio que prioriza a renovação e a reutilização. Ela começa com o desenvolvimento pessoal, permitindo que as pessoas cooperem para criar abundância compartilhada, em vez de reforçar padrões ultrapassados de escassez competitiva. É o desejo de ter um impacto regenerativo no mundo.

O passo da sustentabilidade para a regeneração é mais do que uma mudança na terminologia simples. É uma mudança de mentalidade e visão de mundo que conduzirá a profundas transformações.

Tais esforços estão criando projetos e trabalhos nas empresas que têm impacto positivo e oferecem oportunidades de aprendizado e inovação. A pergunta que fica é:

os negócios verdadeiramente regenerativos são, de fato, possíveis dentro dos limites de nosso sistema econômico estruturalmente disfuncional e degenerativo?

No artigo “O mercado da economia circular”, escrito por Patricia Berardi e Joana Maia Dias, publicado na Biblioteca da Fundação Getúlio Vargas, é apontado que esse tipo de economia se apresenta como um ciclo fechado, que aumenta a eficiência do uso de recursos e reduz os níveis de poluição. Tal modelo ainda apresenta os três princípios da economia circular:

  1. Preservar e aumentar o capital natural, sendo fundamental controlar estoques finitos e equilibrar o uso de recursos renováveis.

  2. Otimizar o uso de recursos na produção, em que a ênfase se dá em circular produtos e materiais com o máximo de utilização (ciclo técnico e ciclo biológico).

  3. Fomentar a eficácia do sistema, por percepção e eliminação das externalidades negativas dos processos.

Como exemplo da sustentabilidade no mundo dos negócios e agindo também acerca da questão destacada estão empresas que praticam o seu comprometimento: a Mercur, fabricante de produtos voltados à educação, sediada em Santa Cruz do Sul (RS), a Semente Negócios, que atua nodesenvolvimento de negócios inovadores, localizada em Porto Alegre (RS), e a Conexsus, uma rede que une empreendedores sociais no desenvolvimento de organizações e negócios comunitários, sediada em Belém (PA).

Quando discorremos sobre a sustentabilidade no mundo dos negócios é comum explorar a teoria, mas a prática é que fala e mostra o que está sendo feito. Por isso, esta reportagem apresenta os cases citados, de empresas que partem dessa mudança de mentalidade, tanto na estratégia do negócio quanto no próprio objetivo traçado pela corporação.

Mercur: por um futuro mais sustentável

Há alguns anos, umas das decisões da Mercur, empresa com 95 anos de atuação, foi de parar com a produção de licenciados da Disney e de outras marcas, mesmo que estes apresentassem um bom rendimento para empresa. Jorge Hoelzel, facilitador da empresa, conta que essa decisão trouxe alguns impactos. “Para a Mercur, aconteceram impactos negativos, como a queda do faturamento e da lucratividade. Porém, mais importante do que estes, foi o impacto positivo de afirmar o posicionamento da empresa com o cuidado com as pessoas e suas relações”, conta ele.

O processo de adoção da estratégia de gestão pela sustentabilidade aconteceu gradativamente. Hoelzel defende que, para aplicar a sustentabilidade no mundo dos negócios, é “Fundamental que se possa estar com as pessoas, construir com elas o mundo que se quer viver”.

Há alguns anos, essas mudanças foram de dentro para fora da empresa, como apontou o facilitador: “Começamos diminuindo as barreiras que nos separam, como hierarquias de comando e controle, salas fechadas e reuniões secretas”. Nessa mudança, ele ressaltou ainda que “O cotidiano da Mercur é muito aberto e participativo, tanto nas ações quanto nas responsabilidades”. Para Hoelzel, a partir da experiência da empresa gaúcha,

“a sustentabilidade não é um conjunto de regras a serem cumpridas, mas, sim, um jeito de considerar a vida em tudo o que se faz”.

Já sobre a economia regenerativa, Hoelzel admite que a Mercur ainda não atua de forma efetiva, mas que “A partir da evolução dos aprendizados sobre o nosso posicionamento, nossas ações passarão a produzir impactos positivos suficientes para regenerar as cadeias de atuação onde estamos inseridos”.

Semente Negócios: educação empreendedora

Por sua vez, a atuação da Semente Negócios parte da tese de que o empreendedorismo fortalece a autonomia de pessoas e de comunidades de prática, promovendo as tecnologias presentes nos territórios. Desde 2011, a empresa trabalha com programas de desenvolvimento territorial e de impacto social e ambiental nos negócios.

Ellen Carbonari, head de impacto da Semente Negócios, comenta sobre a atuação da empresa frente à sustentabilidade no mundo dos negócios. “É importante que haja iniciativas inovadoras que estejam alinhadas a uma nova economia e uma nova relação com os recursos naturais, de modo a provocar as organizações a refletirem sobre a geração de valor compartilhado nas suas estratégias de longo prazo”, explica.

No trabalho, um mapeamento feito a partir de um processo de imersão e estrutura da organização e da sua comunidade de prática permite que sejam implementados “Programas de aceleração, inovação aberta e laboratórios de inovação social que geram os resultados esperados”, explicou a head de impacto. O resultado? Já participaram oito mil empreendedores inovadores e organizações, como Natura, Instituto Conexsus e Fundação Telefônica Vivo.

Para Carbonari, empresas que estão aquém de sua posição dentro da sustentabilidade podem encontrar dificuldades. A head de impacto da Semente Negócios alerta que:

“uma empresa que não está atenta ao impacto que gera, encontra dificuldades de engajamento de clientes, talentos e, em breve, também de investidores”,

Desse modo, o empreendedorismo inovador só ocorre “A partir da inclusão da diversidade, do uso de tecnologias sociais e do acompanhamento de métricas para garantir que estamos indo em direção aos resultados desejados”, esclareceu Carbonari. Nesse sentido, ela explica que “A regeneração é uma tendência no consumo de orgânicos e tem como premissa curar os danos que já foram feitos à terra”. E ainda completou: “Ou seja, temos um volume de consumidores cada vez mais conscientes e exigentes. Entretanto, o verdadeiro impacto só será possível quando as indústrias e as grandes corporações aderirem à agenda produtiva sustentável. É preciso mudar a forma de produzir tanto quanto a de consumir”.

Conexsus: desenvolvimento de negócios comunitários

Desde 2016, o trabalho da Conexsus é formado por uma equipe descentralizada e dinâmica de empreendedores sociais e planejadores regionais. A equipe busca desenvolver o ecossistema dos negócios comunitários de impacto socioambiental e realiza a articulação das conexões para a evolução do setor e o fortalecimento dos seus impactos positivos.

Segundo Monika Roper, coordenadora do Desafio Conexsus, a empresa “Busca intermediar novos arranjos e desenvolver soluções inovadoras com os atores do ecossistema, que além dos negócios comunitários, abrange organizações de apoio, órgãos públicos, agentes do mercado, financiadores e investidores, bem como instituições acadêmicas e de pesquisa”. A atuação nesta frente é constituída em rede e trabalha em três pontos: modelagem de negócios, comercialização e soluções financeiras.

A Conexsus também lidera o “Movimento Negócios pela Terra”, iniciativa que busca trabalhar gargalos e desafios a partir da demanda real de empresas e indústrias nas cadeias em que os negócios comunitários estão inseridos. “O Desafio Conexsus possibilitou desenvolver um entendimento inicial destes elementos e buscar caminhos para a construção de soluções nos elos iniciais do ecossistema. Mas a ativação do conjunto de atores fundamentais para o seu desenvolvimento ainda apresentará novos desafios”, pontua Roper.

Os dados do Desafio Conexsus mostram todo o potencial acerca da iniciativa. Do lançamento em junho até final agosto de 2019, 82 empresas dos mais variados portes manifestaram demandas por quase 300 produtos. Segundo a explicação da coordenadora, a partir do cruzamento com as bases de dados sobre os negócios comunitários, a Conexsus identificou cadeias prioritárias e iniciou o trabalho de construção de arranjos de comercialização.

Percebe-se, a partir das três experiências, o quão importante se faz hoje refletir sobre sustentabilidade nos negócios. Fica o questionamento:

Quem é que faz na prática e quem é que apenas usa o discurso para parecer sustentável?

E mais: faz parte da reflexão o quanto precisamos de empresas e pessoas que prestem atenção à qualidade da experiência humana no local de trabalho e ao impacto dos negócios no ecossistema, mas que isso seja visto na prática e não fique apenas na teoria.

Matéria acessada em: AUPA – Jornalismo de Impacto – Junho/2020

bottom of page