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Negócios de Impacto: o trabalho da Aventura de Construir

Há duas semanas, publicamos no blog AdC uma conversa realizada com a professora da USP Graziella Comini, pesquisadora no tema de negócios de impacto. A partir de um encontro interno realizado com a equipe da Aventura de Construir, Graziella contou sobre a trajetória de sua pesquisa, explicou sobre o ecossistema de negócios de impacto e trouxe insights sobre a discussão entre abrangência e profundidade na área.

Hoje trazemos a continuação deste encontro, incluindo os pontos que a própria equipe AdC trouxe para a conversa.

Confira abaixo!

Após Graziella Comini apresentar sua pesquisa, abriu-se o diálogo com a equipe da Aventura de Construir, para uma troca sobre as experiências vividas pela AdC. A partir de uma dúvida trazida pelo consultor da AdC Paulo Felletti, sobre organizações que foram citadas na pesquisa de Graziella, citou-se o case do Banco Palmas, banco comunitário brasileiro, fundado em 1998 na periferia de Fortaleza.

Graziella explica as características de uma instituição desse tipo: “o Banco Palmas não só gera um impacto no mercado local, mas cria uma indústria. Quantos outros bancos populares criam sua moeda social a partir desta experiência. E é algo que tem uma influência enorme e cria algo bastante disruptivo”.

“Por isso é um caso emblemático de como que, dentro de uma lógica de mercado, dentro da seara de mercado financeiro, é possível se posicionar de uma maneira bem diferenciada. Claro que neste caso, o próprio empreendedor é “empreendedor social puro sangue”, portanto ele não está querendo ser aceito pelo mercado financeiro. Ele quer simplesmente desenvolver aquela localidade.”

Na continuação do diálogo, Paulo cita o caso do projeto Reciclando Oportunidades, realizado em 2022: “consigo relacionar o que você falou e trazer para realidade do nosso projeto. É muito interessante a categorização que realiza na pesquisa entre os empreendimentos mais mercadológicos e os mais sociais. A gente teve uma experiência com uma franquia na conjuntura de uma empreendedora que precisava de uma construção mais voltada para o social e a nível local, mas na prática acabou indo para o mercadológico. O que não era mais a categoria mais adequada para ela. Então a pesquisa fez total sentido e nos ajuda a analisar melhor o que acontece no dia a dia do nosso trabalho”.

Negócios de Periferia

Na sequência, Silvia Caironi, coordenadora-geral da AdC, questionou sobre a conexão entre o estudo com empreendimentos de impacto e a realidade da periferia, já que a Aventura de Construir trabalha justamente com esse público.

Na pesquisa de Graziella, foram identificados empreendimentos que não foram criados por pessoas da periferia, mas que atendiam problemáticas na periferia. “A gente não tinha um olhar tão apurado sobre essa dinâmica e nem se comentava tanto nas periferias sobre o tema. Assim, toda iniciativa do Edgard Barki e do DJ Bola com a Articuladora ANIP foi algo realmente revolucionário. Identificaram que tem muito potencial na periferia e, mais do que fornecer mão de obra para empresas, devemos pensar em como fomentar empreendimentos nestes locais”.

“A nossa pesquisa não foi reproduzida de fato na periferia, mas existem alunos que estudam e querem estudar empreendimentos periféricos. Para eles, sempre indico os estudos do Barki, pois acho que tem muita consistência, já que ele foi fazendo trabalhos na prática e então refletindo e criando alternativas.

Invertendo a lógica

A equipe AdC trouxe então pontos citados no evento de lançamento do manual “Da Experiência, Um Método”. Entre eles, a tendência de se partir da experiência e da celebração de negócios tradicionais para depois levar esses aprendizados para negócios de periferia. Seria necessário inverter essa lógica e partir das especificidades e necessidades deste empreendimentos.

Graziella concorda que há uma inversão de saberes: “acho que é necessário a gente aprender muito mais na dinâmica desses empreendedores. Aprendemos muito mais quando olhamos para trás e vemos o que foi possível e relevante desde a fase de construção.

“Trabalhar no fortalecimento da capacidade e da potência de cada empreendedor é um aspecto fundamental. E é nisso que a Aventura de Construir trabalha quando lida com a questão da autoestima, de fazer o empreendedor acreditar. Ele sempre foi inserido num contexto no qual não se acreditava no seu potencial, e quando você entra numa aceleração de negócios tradicionais isso nem é trabalhado”, continua Graziella.

A professora inclui também o elemento da cooperação na conversa: “eu acredito muito na colaboração como um princípio norteador da ação social, e ela deve estar posta nas suas várias possibilidades. Quando eu penso no empreendimento e eu crio um processo de aceleração onde eu vejo que eu tenho competências que podem ser complementares, porque não estimular isso?!”.

O Trabalho em Rede

Raquel Santos, coordenadora da área de Desenvolvimento de Projetos, retoma a questão do trabalho conjunto: “na AdC, temos como método partir da realidade, ou seja, partir da bagagem do outro. Então, em qualquer formação que vamos fazer o nosso objetivo é construir de uma forma coletiva, porque é muito mais interessante partir daquilo que a pessoa já sabe. Você fala muito da questão do cooperativismo e para a gente é um ponto muito forte que a gente vem tentando também incluir em todos os projetos, apesar de encontrarmos dificuldade em manter”. 

“No projeto Vi a Mão Empoderada de Mulheres Empreendedoras, realizado em Viamão/RS, existiu a criação de uma rede de mulheres empreendedoras com todo o fomento e o apoio da Lilian, como coordenadora do projeto. Mas quando acaba esse projeto existe uma dificuldade de manter essa rede e a cooperação, seja em função da rotina muito acelerada das participantes, por verem que não faz tanto sentido ou até uma falta de abertura para o outro”, afirma Raquel.

Para Graziella é de fato um desafio. “Não é fácil fazer as pessoas perceberem o valor de estar atuando numa rede, pois quando elas percebem elas continuam, mesmo que sem um mediador. No início ainda se necessita desse orquestrador, mas precisamos que eles entendam que, apesar de viver ou de sobreviver sozinhos, com a rede possivelmente consigam fazer muito mais com menos esforços”. 

“Existem casos em que as pessoas se sentem meio “claustrofóbicas” e não querem ficar amarradas naquela situação, tendo a rede apenas como uma potencializadora. Mas é possível caminhar em paralelo com os cliente próprios e com a rede, se vai testando e identifica-se o formato em que se tenha mais compatibilidade”, afirma a professora.

A partir da discussão, já surgem ideias. Silvia Caironi comenta: “de fato, nós nunca colocamos o tema da rede como alternativa a iniciativa individual mas, por exemplo, uma coisa que poderíamos fazer é dar ferramentas para que elas empreendedoras possam fazer um trabalho de comparação”.

“Em outros projetos”, continua Silvia, “é evidente que esta forma de colaborar, de se relacionar, funciona muito mais. Por exemplo, o projeto com migrantes ProtagonizAqui, que o Bruno e o Paulo estão no desenvolvimento. Alguns participantes chegaram a apresentar planos de negócio conjuntos, para se candidatar ao capital semente. Nós tínhamos orientado-os para evitar que tivessem muitos negócios, o que geraria concorrência, então é super interessante ver  esse trabalho em conjunto”.

“Outro exemplo é o projeto no Jardim Lapena, realizado em parceria com a Tide Setúbal. Os participantes são pessoas intelectualmente e humanamente muito vivas, preparadas e  com negócios que são complementares entre si. Isso nos possibilita até a desenvolver um mapa de relacionamento entre eles, para entendermos que tipo de sinergia podem se fortalecer. Podemos então desenvolver eles dentro de um contexto que pode promover um impacto significativo na comunidade”, completa Silvia.

Graziella conclui: “às vezes as pessoas não querem trabalhar em conjunto, e devemos respeitar isso. Mas o espaço da Aventura de Construir é criar este mapa onde cada um saiba onde cada um está, fazendo o que em seus negócios. Identificar os principais diferenciais, as competências organizacionais. Assim já se consegue visualizar as possibilidades de criar grupos. Acho isso incrível em termos de impacto na localidade, no sentido de gerar pertencimento no território. Se cria todo um fomento naquele território. Esse é um dos grandes diferenciais da Aventura de Construir: esse olhar para o território de forma muito mais profunda que outras organizações”.

Para conhecer mais sobre o assunto do ecossistema de impacto e o trabalho da Aventura de Construir com negócios de impacto de periferia, confira o e-book “Da experiência, um método: Manual Jornada Integral com Negócios de Impacto Social de Periferias“, realizado em parceria com a Fundação Tide Setúbal e o ICE (Instituto de Cidadania Empresarial). O projeto é a sistematização das experiências acumuladas, aos longos dos 11 anos de atuação com ações de impacto social, para que possam ser compartilhadas e multiplicadas.

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